Escultura na Estrela
Há mais de um século que o jardim tem
recebido diversas peças escultóricas no propósito de “civilizar“ a gente
alfacinha, embora de algumas só tenha ficado na memória.
Cerca de 1884, vinda da cascata do
Passeio Público do Rossio, que então se desmantelava para conclusão da
Avenida, recebeu a herança romântica dos cisnes de pedra para os lagos e da Náiade para a gruta artificial, antigas esculturas de
Francisco de Assis Rodrigues, que fora professor na Academia.
Na transição daquele século, junto à
escola Froebel, teve uma Primavera em
Faiança da Fábrica de Devesas (Vila
Nova de Gaia), cópia industrial de um bronze do escultor francês Maturino
Moreau.
A fervorosamente republicana década de
10 foi pródiga em esculturas para a Estrela. Logo, em 1911, para receber os
congressistas internacionais do Turismo, foram espalhadas cenograficamente,
pelo jardim, cerâmicas coloridas, representando gafanhoto, rãs, cogumelos,
caracol, golfinho e fabulado conjunto de Grou e Raposa, oriundas da Sociedade Fabril das Caldas, do Bordalo
Pinheiro, resultando numa surpreendente animação que foi muito elogiada.
No mesmo ano, o município encomenda
duas obras, segundo os modelos apresentados na Exposição da Sociedade de
Belas Artes, destinadas a um jardim público: O Despertar sensível do escultor Simões de Almeida, sobrinho,
colocado na Estrela desde 1912 e O Cavador, escultura realista de Costa Mota, tio, instalada no ano seguinte– um
acerto por modas estrangeiras, investindo a edilidade na educação pela arte
pública, bem visto na imprensa.
O primeiro monumento
foi inaugurado em 1914, dedicado ao popular actor Taborda, que falecera poucos anos antes, com busto de Costa
Mota, sobrinho, sob base do arquitecto municipal José Alexandre Soares.
Ainda, neste ano, A Fonte da escultora Mª da Glória Ribeiro da
Cruz foi encenada entre verdes murmúrios, junto à escola, e aí permaneceria
até aos anos 40.A fantasiosa escultura da Guardadora de Patos, possivelmente adquirida por esta altura, foi
colocada no meio de um lago, animado por patos de penas, ensaiando uma ilusão
que permanece...
Nos agitados anos 20, surgiram novos
monumentos: erguido por subscrição e presidencialmente inaugurado em 27, o de
homenagem a Teófilo Braga, escritor e ex-presidente da jovem república, com
busto modelado pelo escultor Teixeira Lopes e desmesurado suporte de mestre
J.L. Monteiro, professor e antigo arquitecto camarário, que viria a ser
retirado da Estrela em 1941; e o primeiro monumento do poeta Antero de
Quental em 1929, também por subscrição, com arrojada escultura de Diogo de Macedo, sob base
do arquitecto Jorge Segurado, vindo igualmente a
desaparecer.
Assim, no início dos anos 40, foram
polemicamente retirados, por algum tempo ou definitivamente, vários
monumentos, até o do actor Taborda não escapou em 43, embora felizmente
reposto (1953). Mas em 1942, também se levantou o primeiro monumento ao poeta
João de Deus –que ali perto tem a sua escola e museu - com retrato em baixo
relevo do escultor Leopoldo de Almeida e um acertado arranjo em êxedra do
arquitecto Raul Lino, propondo murete com bancos adossados, pertinentemente
convidando à leitura, que viria a ser, mais de uma década depois,
infelizmente desmantelado. Em 1951, novo e melhor monumento a Antero de Quental, desta vez com angustiada estátua de Barata Feio, foi inaugurado
pela Câmara na velha gruta, deixando uma obra maior no jardim.
Décadas mais tarde, em 1986, o resto
de um velho tronco de ulmeiro seco foi entalhado num gosto naif por M. Vladimiro da Silva, sacando-lhe rostos entre exuberante flora e
inscrevendo-lhe os antigos nomes da capital; a obra Árvores Encantadas viria a desaparecer, vandalizada pelo fogo, cerca de
1998.
Nova Homenagem camarária e da
associação dos jardins escola ao autor da Cartilha, no centenário de 96, fez surgir uma estátua do
escultor Laranjeira Santos, segundo um pequeno modelo de Leopoldo de Almeida
datado de 33.
Assim, durante Novecentos, a memória
dos dois poetas e amigos parece ter a força de renascer sempre, em pedra e
bronze, talvez, porque o jardim é poeticamente dedicado a Guerra Junqueiro.
Fonte:
Pedro Bebiano Gomes(GEO)
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