sábado, 4 de maio de 2013



Recordar Mayer Garção   -  III

A Vénus de Pedra

Por entre os ramos, entrevê-se a lua;
corta o luar as sombras do arvoredo…,
- Uma Vénus de pedra grave e nua,
no parque do castelo alveja o medo.

Nua e soberba, luminosa e pura,
é um sonho de amor que se gelou!
Nada lhe ofusca a eterna formosura.
como é de pedra, é virgem. - Nunca amou.

Envolvem-na na mesma adoração
os astros que vagueiam pelo espaço
e as folhas que se arrastam pelo chão…

Cobre-a agora da luz um raio baço…
- Mas a tranquila deusa é sem paixão,
e o seu olhar é frio como o aço.

Francisco de Sande Salema Mayer Garção




















Soneto autógrafo de Mayer Garção (Francisco de Sande Salema Mayer Garção,1872-1930), sem data, dedicado a sua filha Maria Júlia, publicado na obra póstuma Cantos da Esperança e da Morte: Inéditos e Dispersos (1932).



Para Maria Julia
New York
"Cidade monstruosa!" ella lhe chama,
– e és bem injusta, filha, d'esta vez,
porque essa forja, que um vulcão inflamma,
não devorou a tua pequenez.

Pelo contrario: com piedosa chamma,
amou-te a graça timida, talvez,
e respeitou, na avesinha que ama,
o seu coraçãosinho portuguez.

Exhausta, no alto mar, uma andorinha,
se acaso passa um collossal vapor,
n'um astro [sic] poisa, a descansar do vôo.

O mastro ri-se; a onda ri, mansinha...
– Se egual sorriso deste á minha flôr,
                                                                 Ó ceo de New York, eu te abençôo!

                                                                                           De teu pae

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