Citizen Grave
Para Quase Todos
Chianca de Garcia
AUTOR teatral, realizador de cinema, encenador, director artístico, Chianca de Garcia foi tudo isso. Algumas peças suas foram êxito nos palcos lisboetas, nos anos 20 e 30, e alguns filmes por ele realizados tiveram igualmente sucesso. Mas ele é, sobretudo, o realizador desse grande êxito popular que se chama "A Aldeia da Roupa Branca". Um dia, em 1939, disse que ia ao Brasil por duas semanas. Nunca mais voltou. Lá ganhou maior nome, fama e prestígio.
Em busca do ser humano
Expresso — Para começar, fale-nos da sua juventude. Enfim, suas primeiras memórias, curiosidades, etc.
Chianca de Garcia — Durante os meus primeiros anos fui contemporâneo de factos espantosos. O assassinato do rei D. Carlos, na rua do Arsenal, em 1908, fez-me descobrir o lado trágico da vida. Há coisas que acontecem quando algo está errado. Foi desde então, com constantes reprimendas familiares, que passei a acompanhar os acontecimentos que estavam conduzindo à queda da monarquia. Frequentei comícios. Uma vez, por acaso, vi Afonso Costa empolgar o povo com palavras de dinamite. Aquilo era bonito. Retórico. A multidão delirava. Foi quando de repente, um agente policial fulminou com dois tiros um velho operário que dava vivas à República. Fugi no meio da pancadaria geral. Também aplaudi António José de Almeida, que quinze anos mais tarde, assistiu, no camarote presidencial do Teatro Politeama, à peça "Filha de Lázaro", que eu escrevera com Norberto Lopes. Agora, era ele quem batia palmas. Mas a nós dois, no palco. No entanto, o Norberto, nunca tinha assistido a comícios, como eu. Também quero lembrar certa manhã em que indo com minha irmã para o colégio, vi o sorridente Bernardino Machado debruçar-se do seu carro, sorrir, e jogar para nós uma rosa que caiu a nossos pés. Minha irmã que era, e sempre foi, terrivelmente monarquista, calcou a rosa, e virou costas. Eu apanhei do chão as pétalas e guardei-as num livro de poesias de Gomes Leal; que levava debaixo do braço.
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