quinta-feira, 16 de junho de 2016








ABRANTES - CIDADE - BERNARDINO MACHADO

















Retirado com a devida vénia de:
     

ABRANTES: ELEVAÇÃO A CIDADE NOS JORNAIS DE 1916

 
A 22 de maio de 1916, a notícia de que Abrantes tinha sido elevada a cidade pelo Congresso Republicano foi comemorada com “muitos foguetes e morteiros” e “à noite iluminaram-se os edifícios públicos”. Ao entrarmos no ano em que se comemoram os 100 anos de elevação de Abrantes a cidade, o mediotejo.net foi pesquisar nos jornais da época como a notícia foi dada à população, corria o ano de 1916.
Na edição nº 835, de 28 de maio de 1916, do Jornal de Abrantes, a primeira página tem o título: “Abrantes Cidade – Por unanimidade de votos, o Congresso da República eleva Abrantes à categoria de cidade”. Nesse artigo, o autor faz referência ao comício havido 8 anos antes e que contou com a presença de Bernardino Machado que, nessa altura, havia prometido que uma vez implantada a República no país, Abrantes seria elevada a cidade: “Quando, haverá 8 anos, o sr. Dr. Bernardino Machado, actual Chefe do Estado, declarou, num imponente comício, que Abrantes seria elevada à categoria de cidade logo que fosse proclamada a República, uma vibrante salva de palmas coroou essa promessa. Quem nos diria, então, que a Lei, que eleva Abrantes a cidade, seria promulgada por sua excelência, como Presidente da República! Merecida homenagem a que acabou de prestar à nossa terra o Congresso da República!”.

 
Nesse mesmo artigo, pode ler-se ainda que “foi em 1914 que a Câmara Municipal de Abrantes resolveu pedir a transformação de vila em cidade” e que “apresentou e defendeu a proposta o vereador sr. Valente Júnior”. “Meses antes, o conceituado comerciante da nossa praça sr. Agostinho Ribeiro apresentou, em Câmara, uma representação firmada por grande número de munícipes, de todas as classes sociais e de todos os partidos políticos, solicitando que esse organismo pedisse ao governo que tomasse a iniciativa de conseguir do parlamento a homenagem que Abrantes acaba de receber”.
Mais à frente, o artigo explica que a notícia da elevação de Abrantes a cidade chegou a 22 de maio, através de um telegrama enviado pelo Dr. João José Luís Damas: “Quando, na manhã do passado domingo, foi conhecida em Abrantes a resolução do Congresso, resolução telegraficamente anunciada ao Jornal de Abrantes pelo dedicado amigo do nosso concelho sr. dr. João Damas, queimaram-se muitos foguetes e morteiros. À noite iluminaram os edifícios públicos”.
Já na edição de 11 de junho de 1916, do Jornal de Abrantes, novo artigo na primeira página evoca “Abrantes e os seus melhoramentos”, ao longo do qual são referidas algumas obras feitas em Abrantes como o Jardim do Castelo, a avenida de Sant´Ana, o matadouro, a conclusão da rede geral da canalização de esgotos, entre outras, bem como os nomes dos beneméritos que contribuíram para a realização destes feitos.


 
Na edição nº 838, de 18 de Junho de 1916, também do Jornal de Abrantes, num artigo na primeira página, com o título “Abrantes, Cidade” começa-se a ler que “Muita gente que não conhece Abrantes comenta desfavoravelmente a resolução do congresso em elevar esta já Notável Vila à categoria de cidade. Outros conhecendo-a bem, mas vivendo aqui, indiferentes a toda a ideia do progresso, criticam chocarreiramente o facto. Nem uns nem outros procedem bem, porque o valor de uma terra não se aprecia só pelo que ela vale industrialmente ou pela densidade da sua população. Temos de apreciar os elementos constitutivos do seu poder de expansão, sua provável tendência no campo das artes, das ciências, das industrias, trabalho agrícola, previdência, etc.”.
Mais adiante, referindo-se ao “que existe aqui digno de mencionar-se”, o autor do texto fala da existência de uma “marcenaria onde o trabalho produzido é digno de elogio, porque é perfeito”; “Mestres d´obra conta Abrantes 3 que não envergonham a terra e também tem muitos outros, práticos, que também são valores apreciáveis”; “pintores profissionais está um, havendo ainda oficiaes da arte, broxantes, etc”.
E continuando no enaltecimento das coisas boas de Abrantes, refere-se ainda que “no hospital fazem-se operações que em Lisboa seriam reclamadas aos sete ventos da publicidade, tão hábeis são os seus operadores” ou ainda que “o dr. Ramiro Guedes possue um laboratório químico que é um verdadeiro templo de ciência e de estudo”.
Era assim, há 100 anos.




“HÁ 100 ANOS… ABRANTES À PROCURA DE SER CIDADE”, POR JOSÉ MARTINHO GASPAR
 



Abrantes comemora hoje o centenário da elevação da “Notável Vila de Abrantes” à condição de cidade, que se consumou a 14 de junho de 1916. O processo, a propósito do qual escreveram Isabel Cavalheiro e Eduardo Campos, resultou de uma promessa de Bernardino Machado, num comício de 1907, a que Manuel Lopes Valente Júnior soube dar força ao garantir a  sua aprovação pelo Senado Municipal, em abril de 1913.
Voltaremos, a seu tempo, a este episódio da elevação a cidade, bem como à vida política abrantina no decurso da 1.ª República, também ela marcada pela instabilidade e pelas lutas político-partidárias entre as diferentes fações em que localmente se subdividiu o Partido Republicano Português. Deste modo, ficar-nos-emos, por ora, pela caracterização daquilo que era Abrantes no tempo em que foi elevada a cidade.
Implantada a República, o Governo Provisório desde cedo erradicou todas as referências à religião católica da vida pública, através da Lei de Separação das Igrejas do Estado. A região de Abrantes, viveu, depois da revolução de 5 de Outubro, inúmeros episódios em que o choque entre os poderes instituídos e a Igreja Católica suscitou cenas que foram do dramático ao caricato.
O desentendimento entre as autoridades políticas e religiosas fez com que os principais templos abrantinos tenham permanecido fechados cerca de três anos. Há exatamente 100 anos, tanto a igreja de S. João como a de S. Vicente estavam encerradas, só reabrindo em 1918. Em novembro de 1917, a política dos arrolamentos, prevista na célebre Lei de Separação, causou agitação séria, quando constou que iriam ser transferidos para Lisboa as riquezas das igrejas locais: “A população fortemente excitada […] tocou o sino a rebate e estava disposta a impedir por todas as formas que se levasse por diante tal intento”, só desarmando quando as autoridades desistiram dos seus intentos.
O concelho de Abrantes apresentava-se como um enorme espaço, repartido entre uma zona industrial e uma vasta zona agrária. As principais indústrias eram a metalurgia, no Tramagal e Rossio, o azeite, em Alferrarede, e a moagem, junto à estação de caminho-de-ferro. Todas as restantes freguesias – exceto S. Vicente e S. João – eram eminentemente rurais, a viver à base de uma agricultura que apenas dispunha, como contributos mecânicos, dos lagares.
Como forma de obtenção de um complemento ao rendimento das populações rurais, na primavera e no verão, constituíam-se ranchos que iam trabalhar para as ceifas alentejanas. Aquando da participação de Portugal na I Guerra Mundial, os rapazes que integravam esses ranchos viam-se obrigados a pedir passaporte ao Governo Civil, para poderem obter esse suplemento em Espanha.
A população do concelho de Abrantes era de 32 322 habitantes em 1913 e de 33 843 em 1920. Quanto à sede do concelho, tinha 7 410 habitantes em 1911 e 7 215 em 1920.
Em 1916, o serviço de limpeza das ruas era “pessimamente feito, encontrando-se monturos, tendo o público em parte também culpa por fazer despejos onde não deve”. Ainda que tenha sido criado um canil municipal, em julho de 1917, a “canzoada continua à solta sem coleira nem açamo, mordendo quando calha […]”. Em 1920, quando um articulista do Jornal de Abrantes se referia à existência de “galinhas com e sem frangos, divagando nalgumas ruas”, estando ainda na ordem do dia a elevação a cidade, foi ao ponto de intitular esta local com a constrangedora questão “Cidade ou aldeia?”.
Esta era, na I República, uma localidade relativamente isolada, mesmo encontrando-se a 3,8 kms da estação de caminho-de-ferro de Abrantes (no Rossio) e a 3 kms da de Alferrarede. Uma das necessidades mais vezes referida no Jornal de Abrantes dizia respeito à instalação de uma rede telefónica que pudesse ligar Abrantes ao exterior. Só em finais de 1927 foi possível quebrar este isolamento, com a inauguração da “Cabine Telefónica”.
A única forma de fugir a um quotidiano de dificuldades, a que as populações estavam aparentemente condenadas, concretizava-se através das festas e do lazer. Nas zonas rurais, sobretudo na época mais quente do ano, sucediam-se as festividades com os seus arraiais, de cariz mais ou menos religioso.
Na sede do concelho, para além de algumas festas sazonais e da feira anual de S. Matias, com as suas diversões, tínhamos com frequência espectáculos de animatógrafo (cinema) e de bandas musicais, sobretudo a de Infantaria 2 (instalada em 1918), nas principais praças e no Jardim do Castelo.
As touradas eram raras e normalmente pouco espetaculares, já o foot-ball, que fez a sua aparição por estas bandas exatamente em 1916, suscitou bastante entusiasmo, levando mesmo à fundação do primeiro clube, a 10 de junho de 1916, o Sport Lisboa e Abrantes.




 
 

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