domingo, 13 de dezembro de 2015








Bernardino Machado e a Vila de Sintra







 
 











HISTÓRIA LOCAL

O FERIADO MUNICIPAL DE SINTRA FOI CRIADO EM 1911 – resenha histórica

F. Hermínio Santos
O Feriado Municipal de Sintra foi criado em 1911 no auge das ideias republicanas. A presente resenha histórica pretende recordar as diferentes datas daquele feriado.
O Decreto de 12 de Outubro de 19101 permitiu às municipalidades «considerar feriado um dia por anno, escolhendo-o de entre os que representam as festas tradicionais e características do município»2.
Em Sintra a «Comissão Republicana Administrativa», presidida por Fernando Formigal de Morais, não foi célere em escolher um dia para feriado municipal o que levou o jornal O Concelho de Cintra, que se apresentava como semanário republicano, na sua edição de 10 de Junho de 1911, oito meses após a publicação do já citado Decreto, a questionar sobre se «Seria conveniente…Que indo já a meio o ano de 1911, segundo da Republica, a camara municipal usando da faculdade que lhe dá o decreto de 12 de Outubro de 1910, declarasse qual o dia que considera feriado no concelho».

27.6.1911 - Primeira deliberação do órgão executivo municipal sobre o feriado municipal

29.8.1911 - Cortejo cívico de homenagem a Latino Coelho - O Dr. Bernardino Machado à frente do cortejo
Só em 27 de Junho de 1911 a Comissão Republicana Administrativa deliberou, por unanimidade, que fosse «considerado como feriado no concelho o dia quinze de Agosto de cada anno». Aquele órgão autárquico entendeu ainda que «antes de se dar cumprimento a esta deliberação, ella seja comunicada a todas as juntas de parochia para que informem se da escolha d’este dia poderá resultar qualquer prejuízo ou transtorno, ou se poderá haver qualquer outro dia que seja preferível considerar feriado».
Das dez juntas de parochia do concelho só três corresponderam ao pedido formulado pela edilidade municipal: Belas, Rio de Mouro e Almargem do Bispo. Desconhece-se o teor dos pareceres daquelas juntas de paróquia. Porém, o correspondente do jornal O Concelho de Cintra em Albarraque, da freguesia de Rio de Mouro, informava os seus leitores, em 8 de Julho de 1911, que «não foi bem aceite n’esta freguezia a deliberação da camara, considerando como feriado no concelho, o dia 15 de Agosto de cada anno». E acrescentava na sua crónica que «A camara melhor andaria escolhendo para dia feriado o 1.º de Setembro, dia destinado á abertura da caça no districto de Lisboa, e que poderia ser um dia de festa para Cintra, aproveitando-se para uma parada agricola, n’essa epoca em que estão paralisados os trabalhos do campo, os importantes elementos de que este concelho dispõe». E terminava assim a sua crónica: «Cremos que a junta de parochia vae representar á camara n’este sentido».
29 de Agosto
Neste contexto a Comissão Republicana Administrativa, reunida no dia 18 de Julho de 1911 considerou que o dia por si «primitivamente designado» para feriado do concelho não era, efectivamente, o mais adequado em virtude de aquele dia ser o da «festa tradicional em Colares, que não permitiria que a população d’esta freguesia tome parte em qualquer manifestação que porventura se pretenda fazer na sede do concelho»3.
Foi então analisada outra proposta, certamente subscrita pelo presidente da edilidade, Fernando Formigal de Morais, em que foram apresentados os seguintes quatro considerandos:
«Tendo em atenção que é de todo o interesse para os interesses do concelho, promover diversões ou quaisquer manifestações que aqui atraiam o visitante, para o desenvolvimento do comércio local que tem na população flutuante um dos seus melhores recursos»:
«Considerando que o concurso de todas as freguesias do concelho, e quaisquer manifestações que na sede do concelho se façam, lhes dá mais brilhantismo e que por isso não convém que o dia escolhido seja o destinado a qualquer festa tradicional de caracter exclusivamente local, em qualquer das freguesias»;
«Atendendo a que passa no dia vinte e nove de agosto o aniversario do fallecimento n’esta villa do illustre sabio e democrata José Maria Latino Coelho, que foi honra e lustre da Patria Portuguesa, e que a população de Cintra pensa em comemorar essa data fazendo collocar uma lapide no predio onde faleceu o egrejio cidadão, e onde por bastantes anos residiu»;
«Tendo em consideração o quanto é justa e devida essa comemoração consagrando um portuguez illustre, que se muito honrou a patria, d’essa honra largamente partilhou Cintra, que elle escolhia para sua residência de verão, passando aqui grande parte do anno, em epocas consecutivas».


Latino Coelho
Na sequência desta proposta a Comissão Republicana Administrativa deliberou, por unanimidade, em 18 de Julho de 1911, «que em homenagem á memoria de um dos primeiros chefes do partido republicano portuguez, cerebro previlegiado que se distinguiu em todos os ramos do saber humano, espírito imaculado que logrou exemplos de salutar civismo, o dia destinado a feriado geral n’este concelho de Cintra, seja o de 29 de agosto de cada anno».
Tão histórica decisão teve imediatamente eco no primeiro número do jornal O Concelho de Cintra, publicado em 22 de Julho de 1911, que pela pena de A.C. (António da Cunha) noticiava a deliberação da Comissão Republicana Administrativa e apresentava algumas notas biográficas sobre Latino Coelho destacando que «não o conheceu a geração que entra agora nas luctas da vida, e d’elle terá talvez uma ideia muito vaga, visto que pouco se preoccupa com o estudo do passado, onde tantas vezes se colhem exemplos para o presente e incitamentos para o futuro; não poderá por isso avaliar o quanto teve de acertada e de patriotica a deliberação da camara fazendo guardar aquelle dia. Latino Coelho foi o primeiro dos nossos contemporaneos, o maior e o mais alto de todos elles». António da Cunha descreveu assim o perfil de Latino Coelho: «Sabio, litterato, orador, militar, foi eximio em todos os ramos do saber humano, foi entre os maiores, o maior de todos, e tão grande e tão proveitosa é a luz que irradiou do seu potentíssimo cerebro, como grande e proveitoso é o ensinamento que nos vem do seu viver de familia».
14 de Agosto
Em 1939 o feriado municipal conheceu de novo outra data. Por proposta do vereador Mário Costa Ferreira Lima a Câmara Municipal deliberou, por unanimidade, transferir o feriado municipal para o dia 14 de Agosto de cada ano.
Aquele vereador justificou aquela sua proposta lembrando «que no dia 14 de Agosto se celebra uma data, que a nossa História regista como uma das mais gloriosas» e que «na Vila de Colares teve os seus dominios o grande português e patriota Dom Nuno Alvares Pereira de Melo, gloria do nacionalismo português, cujo nome está intimamente ligado ao feito de armas que teve lugar naquele dia4». Por fim, «considerou que o Município de Sintra, deve contribuir para que seja perpetuada tão patriótica data».

D. Nuno Álvares Pereira
29 de Junho
No entanto, a proposta aprovada pela Câmara Municipal não foi efectivada. O jornal O Concelho de Sintra dá-nos conta no seu número de 24 de Junho de 1939 que o Conselho Municipal deliberara fixar o feriado municipal no dia 29 de Junho de cada ano. E o mesmo jornal na sua edição de 1 de Julho de 1939 relata que «passou no dia 29 de Junho, mais um feriado municipal, agora transferido para esta data com intenção de que não chegamos a perceber o alcance» E o mesmo periódico acrescentava: «Seja a data desvirtuada muito embora que por isso não nos escusamos de felicitar a ilustre vereação da nossa terra (…) pelo amor, carinho e dedicação com que veem defendendo os interesses da nossa querida terra que desejamos ver, mais do que tudo engrandecida».
14 de Agosto
A fixação da nova data do feriado concelhio foi alvo, em 1942, de «protestos e divergências que se verificaram relativamente ao facto de o dia feriado ser no dia vinte e nove de Junho» o que levou o vereador Mário Costa Ferreira Lima, após recordar à Câmara, na sua reunião de 25 de Junho de 1942, «as deliberações sobre o feriado municipal do Concelho», propor que «o feriado seja transferido para o dia catorze de Agosto a partir do proximo ano», embora não invocando os mesmos motivos que o levou a propor, em 1939, aquele mesmo dia para feriado municipal. A proposta apresentada por Ferreira Lima mereceu a concordância unânime da Câmara. A intervenção do presidente do executivo municipal, coronel Ciríaco José da Cunha Júnior, naquela reunião permite-nos compreender os conflitos entre empregados e patrões. O que disse durante a apreciação daquela proposta revela-nos que «no corrente ano [1942] devido á coincidencia do dia feriado ser no dia do descanso para os empregados do Comercio, se haviam dado divergencias não só entre empregados e patrões, como, mesmo entre estes, pelo que teve de resolver o assunto pela forma que entendeu e superiormente lhe foi autorisado». E o presidente da Câmara concluiu afirmando que «se soubesse antecipadamente o que se passaria teria desde logo proposto que se alterasse o dia feriado do concelho».

Paços do Concelho

29 de Junho
Em 1951 foi novamente alterada a data do feriado municipal. Efectivamente, na reunião da Câmara realizada em 10 de Maio daquele ano, o vice-presidente, capitão Américo dos Santos, apresentou uma proposta ao executivo municipal no sentido do dia feriado municipal ser comemorado no dia 29 de Junho de cada ano. Justificou a sua proposta recordando que era a «data em que se realiza a Feira anual de São Pedro, dia de festa tradicional e característica para o nosso Concelho acrescendo a sua importância comercial, agrícola e comercial». E o vice-presidente da Câmara lembrou ainda que, nos termos do n.º 3 do art.º 48.º do Código Administrativo o «dia anual do concelho deve ser escolhido entre as datas das suas festas tradicionais e características».

Feira de S. Pedro de Penaferrim

Imagem de S. Pedro
O dia 29 de Junho foi restabelecido como feriado do concelho e assim permanece até aos nossos dias.
Entretanto foi publicado o Decreto-Lei n.º 38.596, de 4 de Janeiro de 1952, que no seu artigo 4.º estabeleceu que «relativamente aos concelhos em que se realizar alguma festa tradicional e característica, poderá o Governo, por decreto do Ministério do Interior ou do Ultramar, autorizar que as respectivas câmaras municipais considerem feriado o dia especialmente consagrado a tais festas».
Dando cumprimento ao estabelecido no Decreto-Lei n.º 38.596, a Câmara Municipal de Sintra tendo em atenção que «o dia vinte e nove de Junho é considerado dia de festa em todo o nosso concelho» e que «nesse mesmo dia se realiza a feira anual de S. Pedro, na sede do concelho, onde ocorrem milhares de forasteiros, muitos dos quais vindos de longe» e considerando ainda que «no referido dia, tradicionalmente, se celebra a maior festa concelhia» deliberou, por unanimidade, em 12 de Janeiro de 1952: «Primeiro – Que seja mantido o dia vinte e nove de Junho como feriado municipal; Segundo – Que se solicite ao Governo a publicação do necessário Decreto». A deliberação da Câmara não constituiu nenhuma inovação já que no ano anterior, mais precisamente em 10 de Maio, o órgão executivo municipal tinha acordado fixar o dia 29 de Junho como feriado municipal. No entanto, deu cumprimento ao estipulado no artigo 4.º do diploma emanado pelo Governo da República.
O Governo, volvidos cinco anos, através do Decreto n.º 41.152, de 12 de Junho de 1957, autorizou a Câmara a considerar feriado municipal aquele dia. O órgão executivo municipal na sua reunião de 22 de Junho de 1957 deliberou, por unanimidade, exarar na acta «um voto de agradecimento a Sua Excelência o Ministro do Interior, pela publicação do citado diploma e que no dia vinte e nove de Junho de cada ano seja festejado condignamente, celebrando-se em São Pedro, além das costumadas festas, um solene Te-Deum».
Notas ao texto:
1 – Publicado no Diário do Governo, n.º 7, de 13 de Outubro de 1910.
2 – Optou-se por apresentar as transcrições com a ortografia de cada época.
3 – Acta de 18.7.1911 da Comissão Republicana Administrativa do Município de Sintra
4 – 14 de Agosto de 1385 – Batalha de Aljubarrota
Publicado no Jornal de Sintra, ed. 3942 de 29 de Junho de 2012









Sem comentários: