Recordar Roberto Queirós - II
Roberto Queirós teve uma grande actividade nas tentativas de formação duma Frente Popular Portuguesa, encontrando-se muita documentação nos espólios existentes na Fundação Mário Soares e no Museu Bernardino Machado.
Guerra Civil
de Espanha 1936-1939
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BERNARDINO MACHADO E AFONSO COSTA
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Documentos Bernardino Machado e Afonso Costa
O eclodir da Guerra Civil de Espanha constituiu uma
preocupação acrescida para a oposição republicana no exílio. O apoio, ainda que
não oficial, do governo de Salazar às forças de Franco, representava uma nova
ameaça ao sonho do restabelecimento do regime democrático em Portugal.
A vitória da República em Espanha tinha causado
regozijo no seio da oposição à ditadura, nomeadamente no campo republicano, que
acalentou o projecto de receber apoio do governo espanhol para a organização
revolucionária. Todavia, a divisão entre as diferentes facções políticas e
ideológicas dos opositores à ditadura, quer no exílio, quer em Portugal, não
permitiu o estabelecimento de uma união que pudesse alcançar a força necessária
para qualquer movimento revolucionário bem sucedido.
Durante os primeiros meses da Guerra Civil de Espanha,
os exilados republicanos em Paris, juntamente com Bernardino Machado, que se
estabeleceu no Mónaco em Janeiro de 1937 (depois de uma breve estadia em
Valência, para onde se tinha mudado em Setembro do ano anterior, abandonando
Madrid, devido à instabilidade causada pelo início da guerra), concertaram
novos esforços para relançar um movimento revolucionário, por um lado, tentando
obter recursos financeiros e, por outro, tentando unir os diferentes
agrupamentos políticos, para o que formaram, em Paris, um “Comité de Acção”,
tendo em vista a criação da Frente Popular Portuguesa.
Neste contexto, entre 1936 e 1937, Afonso Costa e José
Domingues dos Santos, com o apoio de Bernardino Machado, procuram obter um
empréstimo do governo espanhol destinado a financiar a propaganda contra a
ditadura e lançar um movimento revolucionário. O empréstimo, além de necessário
em termos materiais, visava ainda incentivar à união muitos anti-fascistas que
até então permaneciam duvidosos quanto ao sucesso de uma revolução.
Paralelamente às negociações junto do embaixador do espanhol em Paris, Luís
Araquistain, para a obtenção do referido empréstimo, as atenções
concentraram-se no redobrar da campanha de propaganda contra a ditadura em
Portugal e de apoio à Espanha republicana.
Em Janeiro de 1937, Bernardino Machado lançou o
manifesto à nação "Pela independência e pela integridade de Portugal"(1), no qual além de analisar a situação da Ditadura em
Portugal e as suas relações com o exército, deu particular atenção à conjuntura
política suscitada pela Guerra Civil em Espanha, denunciando a solidariedade do
governo de Salazar com os revoltosos liderados por Franco, colocando especial
ênfase na questão do iberismo, ao afirmar que “a união da reacção que hoje
governa em Portugal com a que pretende governar amanhã em Espanha é a ameaça do
ressurgimento da União Ibérica”, e que “servir os inimigos da nova Espanha
livre é servir os inimigos seculares do Portugal restaurado”. Bernardino
Machado chamava ainda a atenção para o lugar de Portugal no quadro das
restantes nações europeias, criticando as relações entre o governo português
ditatorial e os governos da Alemanha e Itália, em detrimento da tradicional
aliança com a Inglaterra, e reavivando a questão das ambições alemãs sobre as
colónias portuguesas.
Em Paris, numa reunião convocada por Afonso Costa e
Domingues dos Santos, à qual assistiram também os exilados Álvaro Poppe, Agatão
Lança e Lago Cerqueira, entre outros, foi decidido mandar traduzir para
espanhol o manifesto de Bernardino Machado e ainda encetar esforços para a sua
ampla divulgação em Portugal, nos meios civis e militares (2).
Por seu turno, Afonso e José Domingues dos Santos subscreveram o manifesto
intitulado “Apelo a todos os liberais e anti-fascistas” (3),
abrindo-o com a afirmação de que a situação portuguesa se tornara “trágica e
perigosa no domínio internacional”, desde que o governo ditatorial tomara
posição “ao lado dos rebeldes” na guerra de Espanha. Afonso Costa e Domingues
dos Santos corroboravam as afirmações contidas no manifesto de Bernardino
Machado, e anunciaram a constituição do “Comité de Acção”, com o objectivo de
incentivar à união de esforços para o restabelecimento das liberdades públicas,
defesa da independência nacional e da integridade do domínio colonial.
Exemplares do manifesto de Bernardino Machado e do
apelo do Comité de Acção foram confiados a Roberto Queirós que, enviado em
missão a Portugal, foi incumbido de os fazer distribuir e ainda de estabelecer
contactos com alguns dos principais representantes dos diversos grupos de
oposição ao Estado Novo.
Todavia, o resultado destas diligências foi reduzido.
A missão clandestina de Roberto Queirós a Portugal não deu os resultados
esperados. Em relatório elaborado no início de Abril de 1937, e dirigido a
Afonso Costa e Domingues dos Santos, Roberto Queirós deixou claro que era
difícil obter o apoio de grande parte dos adversários da ditadura, afirmando
ainda que constara que seria inviável qualquer projecto de revolução sem o
apoio do Exército, algo que se afigurava difícil já que o único militar republicano
que poderia congregar em torno de si os vários sectores do Exército era Ribeiro
de Carvalho, e este não mostrava empenho em assumir a chefia militar de uma
revolução (4).
O empréstimo solicitado ao governo espanhol deparou
com a divergência de opiniões no seio dos membros do governo de Espanha, de que
resultou a comunicação ao Comité de Acção, através do embaixador espanhol em
Paris, da inviabilidade da operação. Por outro lado, a união das várias
correntes políticas de oposição à Ditadura enfrentou resistências, que não
permitiram a concretização do plano, no qual Afonso Costa e Domingues dos
Santos tanto se tinham empenhado(5).
A morte de Afonso Costa, no princípio de Maio de 1937,
deixou o projecto de união dos militantes anti-fascistas praticamente sem prossecução.
Bernardino Machado e José Domingues dos Santos prosseguiram a sua actividade de
propaganda contra a Ditadura de Portugal e em favor da república espanhola,
embora sem grande impacto. Pouco depois, Bernardino Machado transferiu a sua
residência do Mónaco para Paris, substituindo Afonso Costa no Comité ali
formado.
No fim do Verão de 1937, Bernardino Machado dirigiu-se
a Juan Negrin, Presidente da Assembleia da Sociedade das Nações, protestando
contra a atitude da Ditadura de se aliar com os governos alemão e italiano no
Comité de não intervenção na guerra civil de Espanha e reafirmando o
respeito pelo que consideram serem as instituições legais espanholas (6). Por ocasião do aniversário do 5 de Outubro, voltou a
criticar a Ditadura e o seu apoio às forças de Franco em Espanha: “E como,
enfeudada a ditadura aos imperalismos estrangeiros – já secunda em Espanha os
representantes do velho imperalismo castelhano , «cuja vitória de todo o
coração deseja» - nos defenderá dos pontentes tentáculos dos cobiçosos assaltos
ao nosso património metropolitano e ultramarino?” (7). E, no início do ano seguinte, dirigindo-se a todos
os defensores da democracia em Portugal, voltou a insistir no apelo ao derrube
da Ditadura, em nome do Comité de Paris da Frente Popular Portuguesa (8).
(!) - 07218.128; Versão impressa do manifesto – doc. Cedido
por Sá Marques (07034.152); outra impressão diferente – 07034.151
(5) - Relatório relativo ao empréstimo solicitado ao governo espanhol e de
balanço da actividade do Comité de Acção, 4-5-1937, doc. 07219.073
(8) - Manifesto de Bernardino Machado intitulado "1 de Janeiro de 1938. Saudação à democracia
portuguesa" – doc. 07034.148.
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