terça-feira, 21 de maio de 2013










É notável o trabalho que o Museu Bernardino Machado está a realizar, publicando a Obra de seu patrono! Assisti no passado sábado, Dia Internacional dos Museus, ao lançamento do terceiro dos volumes dedicados à Política, que, como os anteriores, é precedido dum texto do Professor Doutor Norberto Ferreira da Cunha.  Assim, iremos ficar também com uma extensa e necessária biografia política de Bernardino Machado, que se tornava premente concretizar. Desejo manifestar o meu reconhecimento cordial á Autarquia de Vila Nova de Famalicão e a toda a Equipa do Museu pelo trabalho que vêm executando. Referiu o Professor Jorge Alves, quando apresentou este livro, não conhecer "nenhum outro Museu que dedique tanto trabalho ao seu patrono, como é o caso deste Museu, o qual é hoje a nível nacional uma referência de republicanismo, transcendendo já há muito o âmbito municipal, já que é uma instituição nacional com impacto nacional."
 


 
        
 
 
     Relato da sessão de apresentação do Tomo 3 - POLÍTICA - retirado do blogue do Dr. Amadeu Gonçalves  - dopresente - clicar aqui.
 
 
 
 
 
Segunda-feira, 20 de Maio de 2013


Bernardino Machado, 1910-1914

 A exposição "Bernardino Machado e a I República" foi resposta no Dia Internacional dos Museus, 18 de Maio




BERNARDINO MACHADO
(1910-1914)
MINISTRO DOS NEGÓCIOS ESTRANGEIROS, SENADOR E EMBAIXADOR

“A República é uma verdadeira religião que une as almas pelo amor e pela fraternidade.”

Bernardino Machado

 RESUMO

Este volume evidencia Bernardino Machado no seu papel como Ministro dos Negócios Estrangeiros do Governo Provisório, ajudando a construir a imagem de Portugal no estrangeiro através da imprensa e temos temas como o da Constituição, do Código Administrativo, a sua opção pela descentralização ou a problemática do sistema presidencial. Num segundo plano, o papel de Bernardino Machado no Senado é a defesa da obra do Governo Provisório e a projecção da unidade republicana. Finalmente, temos o papel de Bernardino Machado como embaixador de Portugal no Brasil, realçando-se o seu papel na republicanização das colónias, as trocas comerciais e uma especial atenção à emigração.


 O Prof. Jorge Alves com o Dr. Manuel Sá Marques, neto de Bernardino Machado

Conferência do Prof. Jorge Alves, da Universidade do Porto

Fico gratificado por vir a V. N. de Famalicão e salientar que o Museu Bernardino Machado é um Museu especial, pela sua actividade cultural e cívica, e tem um patrono específico, não conhecendo nenhum outro Museu que dedique tanto trabalho ao seu patrono, como é o caso deste Museu, o qual é hoje a nível nacional uma referência de republicanismo, transcendendo já há muito o âmbito municipal, já que é uma instituição nacional com impacto nacional.
Sinto-me ainda gratificado porque Bernardino Machado é uma figura de referência do meu círculo de sociabilidade. Nasci e vivi a quinhentos metros do velho palacete de Miguel Dantas e para quem vive numa aldeia do Alto-Minho, que tem um palacete brasileiro com aquela pujança urbanística, e depois os mais velhos sempre a falarem do que então ali se passava em termos políticos (não esqueço que na freguesia de Romariz, onde está o Palacete, por exemplo, no tempo das eleições de Humberto Delgado, este aqui teve a maioria, caso único no Alto-Minho!), teve uma actividade política com Miguel Dantas, que era regenerador, e depois com Bernardino Machado. A minha família, a nível dos ascendentes, teve uma ligação a Bernardino Machado e a Elzira Dantas, caso do meu bisavô, Tomás Alves, o Tomazinho, que aparece frequentemente nas fotografias, e foi o responsável pela Fábrica de Laticínios de Mantelães, e o irmão dele, o Narciso Alves da Cunha, que foi deputado à Constituinte em 1911, evidentemente que sendo ele um político regenerador, e com as dissidências, alinhou pelo republicanismo, como sendo um dos três clérigos eleitos pelo Alto-Minho, necessariamente pela influência de Bernardino Machado, que, como diz neste livro, preferia adesivos de boa consciência a históricos de má índole.



Dr. Artur Sá da Costa, coordenador da rede museológia municipal, com o dr. Manuel Sá Marques

Já não sou do tempo de Bernardino Machado, mas sou do tempo do filho, Inácio Machado, onde durante dois ou três anos, nas tardes entre 1968 e 1969, falávamos de política, numa altura em que falar de política era complicado; e até me sinto endividado, na medida em que, para além de ter trabalhado no livro do meu tio, Narciso Alves da Cunha, nunca dediquei propriamente um trabalho a Bernardino Machado, excepto uma vez em que numa pequena referência, no livro dos brasileiros, falo do Palacete de Mantelães. Aliás, no tempo da resistência, o Palacete de Mantelães foi um espaço de acolhimento de resistentes. Finalmente, numa terceira anotação inicial, o Museu e os seus responsáveis podem-se sentir orgulhosos por terem uma colecção de obras do patrono, nos quais está patente uma nova perspectiva de escrever a história de Portugal, sob o ponto de vista de Bernardino Machado, as suas posições, os seus confrontos, os seus combates, e atendendo à longevidade da sua actividade política, foge aos padrões habituais, cingindo-se aos valores da República, princípios doutrinais, trazendo esses valores à prática, sendo isto o que se pode retirar desta obra, havendo uma passagem de propaganda à afirmação política e ideológica do tempo da oposição para um tempo de realização, de concretização e de consolidação.
A instauração da República pode ser lida numa perspectiva de evolução, isto é, ver a revolução na evolução. Este volume diz respeito, essencialmente, ao período de 1910 a 1913, vai um pouco a 1914, e é o período da instauração da República, no Bernardino Machado exerce as suas funções de Ministro dos Negócios Estrangeiros no Governo Provisório, passando depois para o Parlamento e desenvolve aqui um papel, por um lado, na defesa da obra do Governo provisório, e, por outro lado, de contestação em relação aos governos ditos constitucionais, a começar pelo de João Chagas, mas que representavam uma facção política, havendo aqui o papel de divisão dentro daquilo a que foi o Partido Republicano Português e, podemos dizer, começou a fase da divisão dos republicanos e, portanto, do fim da República; e, se alguém chamou a atenção para esse perigo foi desde o início Bernardino Machado, quando apelava à união e à unidade, no sentido da consolidação da República. Só quando a República estivesse consolidada, aí sim, deveriam aparece as divergências e as organizações políticas. Estas linhas essenciais são evidenciadas na introdução, dando-nos a compreensão e a expressão dos vários grupos que se iam afirmando, nomeadamente a luta entre o Directório e o Governo Provisório, situação esta difícil de entender, mas que é verdadeira.



 Dr. Manuel Sá Marques com o editor das "Obras" de Bernardino Machado, das Edições Húmus, o Sr. Rui Magalhães

O papel de Bernardino Machado com o Governo Provisório foi o de ajudar a construir a imagem de Portugal no exterior, enquanto Ministro dos Negócios Estrangeiros e faz esse papel de forma sistemática, preocupando-se nomeadamente com as mensagens que é necessário enviar para o exterior em termos de imprensa, nomeadamente com as suas célebres conferências de imprensa com os jornalistas estrangeiros, para além da actividade normal, naquilo que é o expediente do Ministério.
Não me tinha apercebido, até hoje, de algumas das intervenções de Bernardino Machado que servem, às vezes para prorrogar as linhas de orientação, mostrando algumas opções, por exemplo, ao nível da Constituição, ao nível do Código Administrativo, a sua opção pela descentralização, isto é, no longo percurso deste tempo Bernardino Machado vai colocar uma espécie de consciência relativamente ao programa histórico do Partido Republicano Português, programa um pouco da consequência do Ultimatum, tendo sido aprovado no congresso do ano seguinte, tendo sido o mote a toda a propaganda republicana, constituindo, por isso mesmo, o compromisso que o partido assumia com a Nação e que uma vez assim instaurado, nem sempre os republicanos estiveram em condições de o aplicar, porque alguns eram novos, já não tinham o compromisso com o programa de vinte anos atrás, outros porque não tinham essa preocupação e outros porque as divergências os levavam a combater, porque eram só do contra. Essas posições são bem salientadas, a displicência de Bernardino Machado relativamente ao poder presidencial, ele que foi Presidente da República, e a afirmar sempre a sua preferência pela formação parlamentar, face às posições presidencialistas de alguns. Essa é uma posição histórica, que vinha desde os inícios do liberalismo e que tem muito a ver com as bases liberais que se fizeram face ao poder absoluto e, portanto, quando se admitia o Rei, como diria Passos Manuel, é preciso rodeá-lo de instituições republicanas e não era agora que a República, que sempre defendera uma posição da herança setembrista e da patuleia, iria mudar de opinião e daí a valorização do poder parlamentar que, de certo modo, se revelou um bocadinho fatal no processos de instauração da República, uma vez que, exactamente, o predomínio parlamentar e a negação do poder presidencial acabaram por criar alguns problemas, daí várias situações, o exercício quase absoluto do Parlamento, fazendo tremer os governos, quer por parte de alguns presidentes, que tentaram ganhar mais poder, e, como diria o próprio Bernardino Machado, isso iria criar um conflito, e daí querer o Presidente da República eleito pelo Congresso e não pelo voto popular, pelo sufrágio universal. É, aliás, uma questão que está totalmente na ordem do dia, ainda hoje, já que é uma marca com Sidónio, com o Estado Novo, o próprio Estado Novo não teve uma linha única, optou pelas duas, primeiro por uma versão de sufrágio e com Humberto Delgado pela versão do Congresso. É uma questão que vale a pena estudá-la e Bernardino Machado deu um contributo interessante para esta altura, sobretudo para nós percebermos como é que foram as opções da República nesta altura. Essas posições continuou Bernardino Machado a defendê-las e a combater pelos valores do velho manifesto para com os primeiros governos de extracção parlamentar, recusando sempre a velha acusação da ditadura que se atribua ao Governo Provisório e valorizando a sua actividade. Hoje, fazendo um balanço histórico da República, nós sabemos que a República foi essencialmente no período do Governo Provisório. As grandes acções, o processo de laicização, a separação, a afirmação dos valores do ensino, tudo isso decorreu essencialmente no Governo Provisório que, não se enredando na discussão parlamentar, pode avançar com algumas propostas, ficando com outras na gaveta, como foi com o caso do Código Administrativo. Não quero reduzir o papel dos republicanos ao Governo Provisório, que tem naturalmente os seus defeitos, nomeadamente o facto de não haver um Governo, mas ministérios, nos quais o ministro tinha uma autonomia muito grande, mas a verdade é que não nos podemos esquecer da obra de um Afonso Costa, ou até de António José de Almeida, por exemplo, no domínio do ensino superior.

O Prof. Norberto Cunha (no lado direito), coordenador científico do Museu Bernardino Machado e das "Obras", na apresentação do Prof. Jorge Alves

Este livro ajuda-nos ainda a perceber um dos problemas que mais aborreceram Bernardino Machado, como é o caso de Batalha Reis, que está bastante documentado, Batalha Reis, um intelectual e um político que ele chamou para o seu gabinete, polémica com o sentido de desprestigiar o próprio Bernardino Machado, do qual iria sair ilibado. Uma outra linha são os congressos do Partido Republicano e o papel de esforço para a construção da unidade que Bernardino Machado desenvolveu, tentando chamar sempre à comunhão política, os grupos que começavam a aparecer. No fundo, o que ele queria era uma República como um regime de pacificação da sociedade portuguesa, de conciliação das classes, de ajustamento do poder político à evolução da sociedade, situação que a Monarquia não teria permitido. São estas as mensagens que Bernardino Machado faz eco em termos de síntese, quando vai para o Brasil como embaixador e, essencialmente no Brasil, procura também criar uma imagem positiva da República em Portugal e, sobretudo, unir a colónia portuguesa então bastante desavinda pela irrupção da divergência política que já vinha de trás, uma vez que muitos dos nossos republicanos têm origem brasileira, há conexões profundas, basta dizer que o próprio Bernardino Machado nasceu no Brasil, mas também nasceram lá Miguel Bombarda, Magalhães Lima, João Chagas, entre outros, e vê-se que o Brasil foi um espaço de recepção e de produção e de reprodução do nosso republicanismo, havendo aqui neste domínio muito ainda a fazer.


O Prof. Jorge Alves, num momento da sua conferência

Seguindo uma linha cronológica, facilitando o entendimento, os textos de 1910 mostram-nos o entusiasmo de Bernardino Machado com a Revolução, na fase inicial os textos mostram precisamente algum êxtase pela Revolução, a qual traz uma regeneração para a sociedade portuguesa, traz-nos a independência, a coesão, a fraternidade, a emancipação, mas, ao mesmo tempo, a preocupação com a ordem, com os serviços públicos e a necessidade de desenvolver uma obra de construção que pudesse libertar o trabalhador, que desse direitos de associação e de reunião, para Portugal ultrapassar o estado triste em que se encontrava. Nas palavras de Bernardino Machado, era a revolução pela lei que o Governo Provisório estava a fazer; ou então, ainda nas suas palavras, “já não há agora delitos de opinião, a opinião é livre dentro da República”, lembrando-se das leis da rolha com que se teve de defrontar no período pré-República.
Os encontros com a imprensa estrangeira não só permitiram a promoção da imagem de Portugal no estrangeiro, como igualmente relativizar o papel dos monárquicos nas suas movimentações trans-fronteiriças, justificar as obras do Governo Provisório, desenvolver uma linha parlamentar para a constituição, o que é que deveria ser e fazer-se e na defesa das eleições de 1911, pelo facto dos monárquicos não terem comparecido às urnas e, portanto, ter havido uma desvalorização das mesmas.
É particularmente importante o relatório aqui transcrito e apresentado à Assembleia Nacional Constituinte; e depois desse trabalho parlamentar, vai ocupar o lugar no Senado e defendendo, por um lado, o papel da unidade republicana, por outro lado, da consolidação da República, mas não deixando de ser um crítico do trabalho que se ia fazendo pelo governo do chamado “bloco” (evolucionistas, unionistas e independentes) em oposição aos democratas, em que desenvolvia uma obra sistemática de desconstrução da obra do Governo Provisório e a tentativa de esvaziar toda a obra de Bernardino Machado, tentando Afonso Costa em 1913 de recuperar, mas já sem o mesmo efeito.
Uma outra situação que temos com este volume é a visão que Bernardino Machado tem da República como religião, mais como uma mística, e que, ao mesmo tempo, servia para mostrar que as religiões podiam existir, não podiam era estar acima da Nação e da Pátria. Eram afirmações que Bernardino Machado tinha de fazer para defender a República das críticas à Lei da Separação, na medida em que há um combate ao clericalismo, não ao clero, dirá Bernardino Machado, ou seja, nada havia contra os padres, havia era contra um sistema que era algo totalitário que envolveu demasiado a sociedade portuguesa.
Para além do caso de Batalha Reis, encontrámos neste volume a ideia da republicanização das colónias, apela à reforma administrativa, no sentido descentralizador para travar o caciquismo, a defesa da agricultura, nomeadamente o apoio às escolas móveis, defendo sempre que a República deve ser do povo e fiscalizada por ele.
Finalmente, o livro tem uma série de textos de Bernardino Machado no Brasil, já como representante diplomático, que são absolutamente interessantes, havendo já uma preocupação com o Brasil, com a sensibilidade às colónias, para com as trocas comerciais, as relações políticas entre os dois países, focando com particular atenção à emigração.

 

1 comentário:

paula disse...

Muito bom!
Pouquinho tempo mas muito bom.
Beijinhos
Obrigada por tudo.
Pl