A propósito duma carta de Alice Pestana para Bernardino Machado, escrita no dia da extinção do Ministério da Instrução - 3 de Março de 1892
Ex. mo Sr.
Passei effectivamente uns dias m.to incomodada. Hoje, porem, quasi convalescida teria ido á Academia se...nos não fechassem desprimorosamente a porta.
Fico mal com todos os Academicos, exceptuando apenas V.a Ex. a a quem m.to tenho q. agradecer por tantos incommodos q. lhe dei.
Muito apreciei o bello discurso de V.a Ex.a, que li sofregamente apenas o descobri.
Eu estou levemente resentida por não o ter recebido ainda. Desvanecido o resentimento, porque não hei de confessal-o?
Dizem-me os jornaes q. foi hoje á Assignatura Real o decreto condenatorio do desgraçado Ministerio da Inst. Pub.
Que resuscite antes é o q. eu desejo; como symptoma de restauração financeira e ainda outras causas não menos valiosas e significativas.
Envio a V.as Ex.as os mais affectuosos cumprimentos.
De V.a Ex.a
m.to ven.a e obrig.a
3-3-92
Alice Pestana
A supressão do Ministério da Instrução Pública por José Dias Ferreira caricaturada por Rafael Bordalo Pinheiro.
Bernardino Machado, como deputado pelo partido regenerador, defendeu a necessidade de um Ministério da Instrução Pública, na sesão parlamentar de 15 de Março de 1886, durante o govêrno de José Luciano, ainda no reinado de D. Luís. Só em 5 de Maio de 1890, no govêrno de António Serpa, é constituido o Ministério da Instrução e Belas Artes, mas que teve uma evolução instável resultante da situação política e financeira que Portugal atravessou após o "ultimatum". Acabou por ser extinto durante o govêrno de José Dias Ferreira, em 3 de Março de 1892. Bernardino Machado na Camara dos Senhores Pares do Reino, sessão de 5 de Fevereiro de 1892, fez uma extensa intervenção defendendo a conservação do ministério.
Do portal do Ministério da Educação e Ciência - Secretaria-Geral - clicar aqui - trancrevemos as referências biográficas dos ministros que ocuparam a pasta do Ministério da Instrução Pública no curto período de 1890 a 1892.
Ministério da Instrução Pública e Belas Artes
Ministros
JOÃO MARCELINO ARROIO
5 de Abril de 1890 a 13 de Outubro de 1890
Nasce no Porto, a 4 de Outubro de 1861. Estuda Direito em Coimbra. Conclui o curso em 1844, e ascende à cátedra no ano seguinte.
No domínio político-partidário, o Partido Regenerador elege-o deputado pelo círculo de Vila do Conde.
Empossado como Ministro da Marinha em 1890, no governo de Serpa Pimentel, passa depois para o Ministério da Instrução Pública e Belas-Artes, pasta que assegurou até 13 de Outubro de 1890.
Nos seis meses de exercício do cargo, destaca-se a apresentação de uma proposta de lei de organização do Ministério, numa iniciativa centralizadora do ensino primário, contrariando os princípios de descentralização determinados pelas leis de 1878 e 1880.
Voltará ao Governo em 1900, para ocupar a pasta dos Negócios Estrangeiros entre 25 de Junho de 1900 e 1 de Junho de 1901.
Na véspera da Revolução Republicana, a 4 de Outubro de 1910, é nomeado Embaixador em Paris.
Orador brilhante, mordaz e contundente, parlamentar activíssimo, ficariam memoráveis os discursos que proferiu, como par do Reino, contra D. Carlos e D. Amélia (1903-1906).
Ainda antes do termo da Monarquia vive algum ostracismo político, dedicando-se à arte – data desse período a ópera Amor de Perdição, estreada no Teatro de S. Carlos a 2 de Março de 1907.
Deixaria ainda diversos trabalhos de jurisprudência e colaboração dispersa na imprensa, nomeadamente no Jornal de Notícias.
Vem a falecer em Sintra, a 18 de Maio de 1930.
ANTÓNIO CÂNDIDO R. DA COSTA (interino)
13 de Outubro de 1890 a 21 de Maio de 1891
Nasceu S. Faustino de Fridão a 29 de Março de 1850.
Fez estudos no Seminário Conciliar de S. Pedro de Braga (1867-1870), alcançou o curso de Teologia e foi ordenado presbítero.
Matricula-se posteriormente na Faculdade de Direito da Universidade de Coimbra, iniciando outro trajecto de vida que o levaria a renunciar ao sacerdócio. Aluno brilhante, licenciou-se em 1877 e prestou provas de doutoramento no ano seguinte. Ingressou no corpo docente da mesma faculdade, ascendendo a catedrático em 1891.
Foi deputado, par do Reino, ministro e conselheiro de Estado. Ponto culminante da sua longa carreira pública, a nomeação, com carácter vitalício, para o Conselho de Estado, o órgão consultivo do monarca, que data de 13 de Março de 1902.
O Parlamento foi, sem dúvida, o palco privilegiado da sua acção política, onde brilhou pelo dom da palavra e pelo fulgor da argumentação.
Titular da pasta do Reino ocupou, interinamente, o Ministério da Instrução Pública e Belas entre 13 de Outubro de 1890 e 21 de Maio de 1891.
Faleceu em Condomil, Amarante, a 24 de Outubro de 1922.
ANTÓNIO VAZ DE S. E MELO (interino)
21 de Maio de 1891 a 17 de Janeiro de 1892
Nasce a 29 de Setembro de 1848, no concelho de Sabrosa, descendente do antigo governador da Índia, Lopo Vaz de Sampaio. Licencia-se em Direito e prossegue estudos com vista ao doutoramento. Interrompe-os, no entanto, ao ser eleito deputado, com apenas 22 anos idade, pelo Partido Reformista, na legislatura de 1870. Seria reeleito em 1877, pelo Partido Regenerador, de que se tornaria um dos mais importantes líderes da década de 1880. É nomeado director-geral da Instrução Pública, em 1878; cargo que exerce por pouco tempo, passando, em Novembro desse mesmo ano, para a Direcção-Geral das Alfândegas e Contribuições Directas. Uma doença grave leva-o, entretanto, a tratamentos no estrangeiro.
É chamado a ocupar a pasta dos Negócios da Fazenda, em 1881. Volta a funções ministeriais em 1885, agora com a pasta da Justiça. Pasta que reassumirá em 1890, na sequência do Ultimatum inglês e queda do governo do Partido Progressista. Na sequência dos protestos contra medidas repressivas e impopulares que põe em prática neste seu mandato, e no seguimento da promulgação de um acordo com a Inglaterra, acaba por ter de demitir-se a muito breve trecho.
Mas, uma vez mais, regressará às responsabilidades governativas em Maio de 1891, como ministro dos Negócios do Reino e da Instrução Pública e Belas Artes (de 21 de Maio de 1891 a 17 de Janeiro de1892). E, de novo, a saúde o atraiçoa, obrigando-o a afastar-se da capital.
Morre pouco depois, a 20 de Março de 1892.
Foi também vogal do Supremo Tribunal Administrativo e par do Reino.
JOSÉ DIAS FERREIRA (interino)
17 de Janeiro de 1892 a 3 de Março de 1892
Nasceu na Aldeia Nova, Arganil, a 30 de Novembro de 1837.
Em Coimbra, onde cursou Direito, obteve o doutoramento em 1860. Dedicou-se à docência universitária tendo a seu cargo as cadeiras de Direito Natural e das Gentes e de Filosofia do Direito, cujas lições deu à estampa com o título de Noções Fundamentais de Filosofia do Direito. Fez sucessivas passagens pelo Governo: integrou o elenco ministerial saído da Janeirinha; no governo de Ávila sobraçou a pasta da Fazenda, da Justiça e do Reino e ascendeu à presidência do Conselho de Ministros durante a crise financeira do início da década de 1890; como Presidente do Conselho de Ministros chefiou dois governos (17 de Janeiro a 27 de Maio de 1892 e de 27 Maio de 1892 a 22 de Fevereiro de 1893). No primeiro ocupou-se também das pastas do Reino e, interinamente, da Instrução Pública e Belas Artes (17 de Janeiro a 3 de Março de 1892): no segundo, novamente a pasta do Reino e também a da Fazenda.
Participou em 25 legislaturas da Câmara dos Deputados. As eleições de 1892, disputadas durante o seu consulado, foram-lhe adversas e obrigaram-no a abandonar o seu tradicional círculo de Aveiro, a que não mais voltou. Todavia, para não passar pelo vexame de, sendo presidente do Conselho de Ministros, não conseguir um lugar no Parlamento, movimentaram-se diferentes influências que não só lhe garantiram a eleição pelo círculo de Aldeia Galega, mas também nos círculos de Penacova e S. Tomé e Príncipe.
Ressentido com o afastamento do poder em 1893, envolveu-se numa conspiração que chegou a ter um movimento revolucionário para 18 de Junho de 1896, o qual faria de Dias Ferreira presidente de um regime republicano em Portugal. Ascendeu a par do Reino em 4 de Abril de 1895.
Faleceu, em Vidago, a 8 de Setembro de 1907.
2 comentários:
Caro Dr, a data respeitante à conclusão do curso de João Marcelino Arroio deve ter sido mal digitada. Com admiração
Alípio Ribeiro
Obrigado!
Fui ver no Anuário da Universidade de Coimbra a data de formatura de João Marcelino Arroio: 1882.
Um abraço cordial do
Manuel Sá Marques
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