terça-feira, 24 de maio de 2011



Epistolário familiar

O ano de 1927 foi penoso para minha Família! É nesta data que meu Avô sai de Portugal, para o seu segundo exílio, e em que surge a meu Pai o descolamento da retina do olho esquerdo. Meu Pai já tinha perdido a visão do olho direito, também pela mesma causa, consequencia de acentuada miopia, em 1904, quando frequentava a Universidade de Coimbra. Em Janeiro de 1927 quando estava a dar uma aula de Física no Liceu Camões, teve uma perda súbita da visão.
Apesar do apoio oftalmológico e ter sido operado em Paris pelo Doutor Felix Lagrange, a sua visão fica comprometida, embora mantendo o ensino da matemática, mesmo cego, até se reformar em 1932.
Neste transe, foi grande o apoio que meu Pai recebeu de Bernardino Machado, que estabeleceu contactos com os especialistas de prestigio internacional, como os Doutores Felix Lagrange e Henry Lagrange, de Paris, e Doutor Jules Gonin, da Universidade de Lausanne.
Transcrevo uma parte da correspondencia então trocada, reveladora do apoio carinhoso que meu Pai recebeu de seu Sogro Bernardino Machado.







Meus Pais e filhos, antes de meu Pai ser submetido à operação realizada em Julho de 1927, em Paris







Meu Pai, já depois da reforma, acompanhado por minha irmã Maria Adelaide








Querido Alberto
Gostei muito das cartas e bilhetes postais, que escreveram a Maria Adelaide e a Elzira. E a Manuela que fez à sua pena? Temos tido sempre notícias, e vejo que a doença que o aflige faz alternativas. Não resolveu reunir em conferência o seu assistente com o Gama Pinto? A medicina o aconselhará, mas julgo que há um ponto que exige toda a atenção. A sua imobilização é necessária para o tratamento dos olhos? Tem de sujeitar-se a ela. Mas se as melhoras locais não se acentuam, creio que não pode senão prejudicá-las também qualquer enfraquecimento geral. Não sei o tempo que aí tem. Aqui, apesar do frio e da humidade, a primavera anuncia-se com bela horas de sol.
Mil Saudades. Abraça-os muito saudosamente a todos.
Vigo, 18-3-927 Todo seu
B. Machado









Meu Caro Alberto
Tenho tido sempre notícias, e estamos todos muito esperançados nas suas melhoras. À Rita agradeço deveras a sua carta, e junto no mesmo abraço enternecido pelas suas lembranças os meus queridos netos. Que escrevam sempre. As meninas sobretudo, e em proporção da sua idade, fazem-no já excelentemente. Este exílio custa-me ainda mais, porque imaginei que não teria de sofrer mais nenhum. Estou cheio de saudades. Estamos.
28-4-927 Todo seu
B. Machado

Saudades com os meus votos para as sua melhoras Sua mãe
Elzira























Bayonne, 24-11-930

Meu caro Alberto
Agradeço-lhe enternecidamente a dedicada consulta. Mas acho que nada mais justo do que a homenagem que os seus Colegas lhe querem prestar. E estimo bem que até os meus inimigos lhe reconheçam e considerem os seus sobressalientes serviços e merecimentos. O elevado valor da sua exemplar carreira pública é um motivo de orgulho para toda a nossa família. E oxalá o seu estado de saúde lhe permita voltar ainda ao posto de insigne educador em que tanto tem honrado o magistério português!
Nossas cordiais saudades a todos. Abraça-o
como Todo seu
Bernardino Machado


A Nela continua muito bem.

Sem comentários: