Epistolário familiar
O ano de 1927 foi penoso para minha Família! É nesta data que meu Avô sai de Portugal, para o seu segundo exílio, e em que surge a meu Pai o descolamento da retina do olho esquerdo. Meu Pai já tinha perdido a visão do olho direito, também pela mesma causa, consequencia de acentuada miopia, em 1904, quando frequentava a Universidade de Coimbra. Em Janeiro de 1927 quando estava a dar uma aula de Física no Liceu Camões, teve uma perda súbita da visão.
Apesar do apoio oftalmológico e ter sido operado em Paris pelo Doutor Felix Lagrange, a sua visão fica comprometida, embora mantendo o ensino da matemática, mesmo cego, até se reformar em 1932.
Neste transe, foi grande o apoio que meu Pai recebeu de Bernardino Machado, que estabeleceu contactos com os especialistas de prestigio internacional, como os Doutores Felix Lagrange e Henry Lagrange, de Paris, e Doutor Jules Gonin, da Universidade de Lausanne.
Transcrevo uma parte da correspondencia então trocada, reveladora do apoio carinhoso que meu Pai recebeu de seu Sogro Bernardino Machado.
Querido Alberto
Gostei muito das cartas e bilhetes postais, que escreveram a Maria Adelaide e a Elzira. E a Manuela que fez à sua pena? Temos tido sempre notícias, e vejo que a doença que o aflige faz alternativas. Não resolveu reunir em conferência o seu assistente com o Gama Pinto? A medicina o aconselhará, mas julgo que há um ponto que exige toda a atenção. A sua imobilização é necessária para o tratamento dos olhos? Tem de sujeitar-se a ela. Mas se as melhoras locais não se acentuam, creio que não pode senão prejudicá-las também qualquer enfraquecimento geral. Não sei o tempo que aí tem. Aqui, apesar do frio e da humidade, a primavera anuncia-se com bela horas de sol.
Mil Saudades. Abraça-os muito saudosamente a todos.
Vigo, 18-3-927 Todo seu
B. Machado
Meu Caro Alberto
Tenho tido sempre notícias, e estamos todos muito esperançados nas suas melhoras. À Rita agradeço deveras a sua carta, e junto no mesmo abraço enternecido pelas suas lembranças os meus queridos netos. Que escrevam sempre. As meninas sobretudo, e em proporção da sua idade, fazem-no já excelentemente. Este exílio custa-me ainda mais, porque imaginei que não teria de sofrer mais nenhum. Estou cheio de saudades. Estamos.
28-4-927 Todo seu
B. Machado
Saudades com os meus votos para as sua melhoras Sua mãe
Elzira
Bayonne, 24-11-930
Meu caro Alberto
Agradeço-lhe enternecidamente a dedicada consulta. Mas acho que nada mais justo do que a homenagem que os seus Colegas lhe querem prestar. E estimo bem que até os meus inimigos lhe reconheçam e considerem os seus sobressalientes serviços e merecimentos. O elevado valor da sua exemplar carreira pública é um motivo de orgulho para toda a nossa família. E oxalá o seu estado de saúde lhe permita voltar ainda ao posto de insigne educador em que tanto tem honrado o magistério português!
Nossas cordiais saudades a todos. Abraça-o
como Todo seu
Bernardino Machado
A Nela continua muito bem.
Sem comentários:
Enviar um comentário